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Alerta Vermelho: Confronto Letal

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Märgi loetuks
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CAPÍTULO 10

06:20

Centro de Wellness do Congresso – Washington, D.C.

Não era fácil de encontrar.

Jeremy Spencer estava de pé à frente de um conjunto de portas de aço encerradas numa sub-cave do Rayburn House Office Building. As portas estavam ocultas num dos cantos do parque de estacionamento subterrâneo. Poucas pessoas tinham conhecimento de que este lugar existia. E menos ainda onde ficava. Sentia-se ridículo mas mesmo assim bateu à porta.

Alguém indicou-lhe que entrasse. Puxou a porta, invadido por aquela velha sensação familiar de incerteza no estômago. Sabia que o Ginásio do Congresso estava fora do alcance de todos, exceto dos membros do Congresso dos Estados Unidos. E contudo, apesar da quebra no protocolo, tinha sido convidado a entrar.

Hoje era o dia mais importante da sua ainda jovem vida. Estava em Washington há três anos e ia subindo aos poucos.

Há sete anos, era um saloio proveniente de um parque de autocaravanas de Nova Iorque. Depois, com uma bolsa de estudo, frequentou a State University of New York em Binghamton. Em vez de relaxar e desfrutar da boleia, tornou-se presidente dos Republicanos do campus da universidade e comentador no jornal escolar. Em pouco tempo já escrevia para a Breitbart e para a Drudge. Agora, era jornalista da Newsmax com a responsabilidade de cobrir tudo o que estivesse relacionado com o Capitólio.

O ginásio não era sofisticado. Havia algumas passadeiras, alguns espelhos e alguns pesos numa prateleira. Um homem já com alguma idade, vestido com umas calças suadas e uma t-shirt, com headphones, caminhava numa passadeira. Jeremy entrou no vestiário silencioso. Dobrou uma esquina e à sua frente encontrou o homem com quem se vinha encontrar.

O homem era alto, cinquenta e poucos anos, cabelo grisalho. Estava de pé em frente de um cacifo aberto, por isso Jeremy viu-o de perfil. As costas eram direitas e o grande maxilar sobressaía. Usava uma t-shirt e calções, ambos ensopados do treino. Os ombros, braços, peito e pernas eram musculados e bem definidos. Tinha o aspeto de um líder de homens.

O homem era William Ryan, Representante por nove vezes da Carolina do Norte e Presidente da Câmara dos Representantes. Jeremy sabia tudo a seu respeito. Vinha de uma família com uma fortuna antiga. Tinham sido proprietários de plantações de tabaco desde antes da Revolução. O seu trisavô fora Senador dos Estados Unidos no período da Reconstrução. Tinha sido o melhor da turma na Citadel. Era encantador, delicado e exercia o poder com um sentido de confiança e pertença tão absolutos que poucos dentro do partido consideravam sequer opôr-se a ele.

“Sr. Presidente?”

Ryan virou-se, viu Jeremy e sorriu-lhe. Envergava uma t-shirt azul escura com letras vermelhas e brancas que compunham duas palavras: PROUD AMERICAN. Estendeu a mão para cumprimentar Jeremy. “Desculpe,” Disse. “Ainda estou um pouco suado.”

“Não há problema, Sr. Presidente.”

“Ok,” Disse Ryan. “Acabemos com os senhores. Em privado pode chamar-me Bill. Se for difícil, trate-me pelo título. Mas quero que saiba uma coisa. Chamei-o e vou dar-lhe um exclusivo. Ao final da tarde, devo dar uma conferência de imprensa com todos os órgãos de comunicação social. Ainda não tenho a certeza. Mas até lá, durante todo o dia, o que eu penso sobre esta crise estará somente ao seu alcance. O que lhe parece?”

“Parece-me fantástico,” Confessou Jeremy. “É uma honra. Mas porquê eu?”

Ryan baixou o tom de voz. “É um bom rapaz. Já o acompanho há algum tempo e quero dar-lhe um conselho off the record. A partir de hoje, já não é um cão de ataque. É um jornalista experiente. Quero que publique o que vou dizer palavra por palavra, mas a partir de amanhã quero que seja ligeiramente mais… subtil, digamos. A Newsmax é ótima mas daqui a um ano vou vê-lo no Washington Post. É onde precisamos de si. Mas antes as pessoas têm que acreditar que amadureceu e se transformaste num justo e equilibrado jornalista de primeira linha. Se é verdade ou não, pouco importa. Tudo tem a ver com perceções. Compreende o que lhe estou a dizer?”

“Penso que sim,” Respondeu Jeremy. O sangue fluía-lhe furiosamente nas veias. Aquelas palavras, ao mesmo tempo que o entusiasmavam, também o assustavam.

“Todos precisamos de amigos nos lugares certos,” Rematou o Presidente. “Incluindo eu. Agora podemos começar.”

Jeremy segurou no telefone. “O gravador está ligado… agora. Sr. Presidente, tem conhecimento do roubo de material radioativo que ocorreu de madrugada em Nova Iorque?

“Sim, tenho conhecimento,” Declarou Ryan. “Como todos os americanos, estou profundamente preocupado. Os meus assessores acordaram-me às quatro da manhã com a notícia. Estamos em contato permanente com as agências de informação e estamos a monitorizar a situação de forma muito próxima. Como sabe, tenho trabalhado no sentido de que seja aprovada no Congresso uma declaração de guerra contra o Irão que o Presidente e o seu partido têm bloqueado constantemente. Estamos perante uma situação de ocupação do Irão a um nosso aliado, a nação soberana do Iraque, e o nosso próprio pessoal tem que passar por postos de controlo iranianos para entrar e sair da embaixada lá. Não me lembro de uma série de acontecimentos tão humilhantes desde a crise dos reféns iraniana em 1979.”

“Pensa que este roubo foi levado a cabo pelo Irão, Sr. Presidente?”

“Antes de mais nada, vamos chamar as coisas pelos nomes. Quer uma bomba rebente no metro ou não, estamos a falar de um ataque terrorista em solo americano. Pelo menos dois seguranças foram mortos e a grande cidade de Nova Iorque está em estado de terror. Em segundo lugar, não temos ainda informação suficiente para identificarmos os terroristas. Mas sabemos que certas fraquezas encorajam este tipo de ataques. Temos que mostrar a nossa verdadeira força e temos que nos unir enquanto país, à direita e à esquerda, para nos defendermos. Convido o Presidente a juntar-se a nós.”

“Como pensa que o Presidente devia agir?”

“No mínimo, tem que declarar o estado de emergência em todo o país. Deverá emitir poderes especiais temporários aos agentes da lei até sabermos quem é esta gente. Estes poderes devem incluir vigilância sem necessidade de mandato, assim como buscas em todas as estações de comboios, terminais rodoviários, aeroportos, escolas, praças públicas, centros comerciais e outros pontos de atividade. Também deverá agir com rapidez para salvaguardar outras reservas de material radioativo existentes nos Estados Unidos.”

Jeremy fixou os olhos ardentes de Ryan. O fogo que deles emanava era quase suficiente para o obrigar a desviar o olhar.

“E o mais importante de tudo: se os terroristas forem provenientes do Irão ou apoiados pelo Irão, então deverá declarar guerra a esse país ou retirar-se e deixar-nos fazê-lo por ele. Se se confirmar que se trata de um ataque iraniano, e perante essa informação o Presidente persistir em bloquear os nossos esforços para proteger o nosso país e os nossos aliados do Médio Oriente… então, que me resta fazer? Eu próprio darei início ao processo de destituição.”

CAPÍTULO 11

06:43

75th Street perto de Park Avenue – Manhattan

Luke estava sentado no banco traseiro de uma SUV da agência na companhia de Ed Newsam. Encontravam-se no lado contrário da rua tranquila e bordejada de árvores de onde se erguia um edifício moderno com portas de vidro duplas e um porteiro com luvas brancas à entrada. Observaram o porteiro a segurar a porta a uma mulher loura e magra vestida com um fato branco que saía para passear o cão. Ele odiava edifícios como este.

“Bem, pelo menos há uma pessoa nesta cidade que não parece minimamente preocupada com um ataque terrorista,” Sentenciou Luke.

Ed recostou-se novamente no banco. Parecia meio adormecido. Com as suas calças bege cargo, a t-shirt branca combinada com as suas feições regulares, a sua cabeça lustrada e a barba cortada rente, Ed não parecia um agente federal. E certamente não se parecia com alguém a quem fosse permitida a entrada no edifício.

Ao pensar em Ali Nassar, Luke sentiu-se incomodado pela circunstância de ter imunidade diplomática. Esperava que Nassar não fizesse disso um cavalo de batalha. Luke não tinha paciência para negociações.

O telefone de Luke tocou. Olhou para ele e carregou no botão para atender.

“Trudy,” Disse. “Em que te posso ajudar?”

“Luke, acabámos de receber uma informação,” Informou. “O corpo que tu e o Don encontraram no hospital.”

“Diz-me.”

“Ibrahim Abdulraman, trinta e um anos, cidadão líbio nascido em Trípoli no seio de uma família pobre. Pouca ou nenhuma educação formal. Alistou-se no exército aos dezoito anos. Em pouco tempo foi transferido para a prisão de Abu Salim onde trabalhou durante vários anos. Esteve implicado em violações dos direitos humanos na prisão, violações essas que incluíam tortura e assassínio de opositores políticos. Em Março de 2011, quando o regime começou a entrar em declínio, fugiu do país. Anteviu o que iria acontecer. Um ano mais tarde, está em Londres a trabalhar como guarda-costas de um jovem príncipe saudita.”

Os ombros de Luke descaíram. “Hmm. Um torturador líbio a trabalhar para um príncipe saudita? Que acaba morto enquanto rouba material radioativo em Nova Iorque? Quem era este tipo?”

“Não tinha histórico de ligações extremistas e não parece ter tido fortes ligações políticas. Nunca foi um soldado de elite e não foi sujeito a qualquer treino mais avançado. Parece-me que era um oportunista, músculo contratado. Desapareceu de Londres há dez meses.”

“Ok, dá-me o nome outra vez.”

“Ibrahim Abdulraman. E, Luke? Precisas de saber outra coisa.”

“Diz-me.”

“Eu não descobri esta informação. Está no grande placard da sala principal. Este Myerson do DPNI não me forneceu as identificações quando as conseguiram e acabaram fazendo a sua própria pesquisa. Forneceram a informação a toda a gente sem sequer nos informarem. Estão a encostar-nos a um canto.”

 

Luke olhou para Ed e revirou os olhos. A última coisa que queria era envolver-se num concurso entre agências para determinar quem tinha o jato de mijo com mais alcance. “Está bem, então…”

“Ouve, Luke. Estou preocupada contigo. Estás a ficar sem amigos por aqui e duvido que um incidente internacional vá ajudar. Porque é que não lhes passamos os dados da transferência bancária e os deixamos resolver o assunto? Podemos pedir desculpa, dizer que fomos excessivamente zelosos. Se te encontrares com esse diplomata, vais estar a brincar com o fogo.”

“Trudy, já não há maneira de recuar.”

“Luke–“

“Trudy, agora vou desligar.”

“Estou a tentar ajudar-te,” Disse.

Depois de desligar, olhou para Ed.

“Estás pronto?”

Ed mal se movia. Apontou na direção do edifício.

“Eu nasci para isto.”

*

“Posso ajudá-los, cavalheiros?” Abordou-os o porteiro à entrada do edifício.

Pendurado no teto do átrio principal, oscilava um lustre cintilante. À direita, repousava um sofá e um par de cadeiras de design. Um balcão comprido espraiava-se ao longo da parede da esquerda com um outro porteiro atrás dele. Tinha um telefone, um computador e uma série de monitores de vídeo. Também tinha um pequeno aparelho de TV a emitir notícias.

O homem aparentava ter quarenta e cinco anos. Tinha os olhos vermelhos. O cabelo estava puxado para trás. Parecia ter acabado de sair do banho. Luke imaginou que já trabalhava aqui há tanto tempo que podia beber a noite toda e fazer o trabalho enquanto dormia. Provavelmente conhecia de vista todas as pessoas que já tinham entrado e saído deste edifício. E sabia que Luke e Ed não estavam entre essas pessoas.

“Ali Nassar,” Atirou Luke.

O homem pegou no telefone. “Sr. Nassar. Penthouse suite. Quem devo anunciar?”

Sem dizer uma palavra, Ed deslizou até ao balcão e pressionou a pega do recetor, afetando assim a ligação. Ed era grande e forte como um leão mas quando se movia, era ágil e delicado como uma gazela.

“Não queremos ser anunciados,” Disse Luke. Mostrou o distintivo ao porteiro e Ed fez o mesmo. “Agentes federais. Precisamos de fazer algumas perguntas ao Sr. Nassar.”

“Temo que tal não seja possível de momento. O Sr. Nassar não recebe ninguém antes das 08:00.”

“Então porque agarrou no telefone?” Perguntou Newsam.

Luke olhou para Ed. Era uma pergunta genial. Ed não parecia ser do tipo dialogante, mas saírasse bem.

“Tem visto as notícias?” Perguntou Luke. “Tenho a certeza de que já ouviu a notícia dos resíduos radioativos roubados? Temos razões parar crer que o Sr. Nassar está envolvido nessa situação.”

O homem olhou em frente. Luke sorriu. Tinha acabado de envenenar o poço de Nassar. Este porteiro era uma plataforma de comunicação. Amanhã, todas as pessoas do edifício iriam saber que o governo tinha vindo interrogar Nassar por causa das suas atividades terroristas.

“Lamento, Sr.” Desculpou-se o homem.

“Não precisa de se desculpar,” Disse Luke. “Basta dar-nos acesso ao andar da penthouse. Se não o fizer, vou prendê-lo por obstrução à justiça e levo-o daqui algemado. Tenho a certeza de que não quer que isso aconteça. Por isso, dê-nos a chave ou código ou o que quer que seja, e depois continue na sua vida. E se tentar alguma coisa com o elevador quando estivermos lá dentro, não só o prendo por obstrução como o prendo como cúmplice de quatro homícidios e roubo de resíduos perigosos. O juiz vai afixar caução em dez milhões de dólares e vai apodrecer em Rikers Island à espera de julgamento nos próximos doze meses. Parece-lhe um cenário agradável…” Luke relanceou a identificação do homem.

“John?”

*

“Ias mesmo prendê-lo?” Perguntou Ed.

Envidraçado, o elevador movia-se no interior de um tubo de vidro redondo na ala sul do edifício. À medida que subiam, a vista da cidade tornava-se avassaladora até resvalar para a vertigem. Agora a paisagem ampliara-se com o Empire State Building mesmo à sua frente e o edifício das Nações Unidas à esquerda. À distância podia ver-se os aviões a tremeluzir sob o sol da manhã ao efetuarem a sua abordagem ao Aeroporto de LaGuardia.

Luke sorriu. “Prendê-lo porquê?”

Ed deu uma risadinha. O elevador continuava a subir.

“Estou cansado. Quando o Don me ligou, estava a ir para a cama.”

“Eu sei,” Disse Luke. “Eu também.”

Ed abanou a cabeça. “Já não entrava nestas cenas urgentes há algum tempo. E não tenho saudades.”

O elevador chegou ao último andar. Um tom quente soou e as portas abriram-se.

Entraram num átrio largo com chão em pedra polida. Mesmo à sua frente, a dez metros de distância, perfilavam-se dois homens. Eram homens grandes, de fato, cor da pele escura, talvez persas, talvez de outra proveniência. Obstruíam um conjunto de portas duplas. Mas Luke não estava preocupado.

“Parece que o porteiro os avisou da nossa presença.”

Um dos homens acenou com a mão. “Não! Voltem para trás. Não podem estar aqui.”

“Agentes federais,” Anunciou Luke e caminharam na direção dos homens.

“Não! Não têm jurisdição. Não permitimos a vossa entrada.”

“Acho que não vale a pena mostrar-lhes o distintivo,” Concluiu Luke.

“Pois,” Concordou Ed. “Não vale mesmo a pena.”

“Quando eu der sinal, ok?”

“Ok.”

Luke esperou um segundo.

“Vai.”

Estavam a uma curta distância dos homens. Luke aproximou-se de um deles e deu-lhe um soco. Ficou surpreendido com a lentidão do seu punho. O homem era ligeiramente mais alto que Luke e tinha a envergadura de um pássaro grande. Obstruiu o soco facilmente e agarrou no pulso de Luke. Era forte. Puxou Luke para si.

Luke levantou um joelho à altura da virilha mas mais uma vez o homem bloqueou-lhe o movimento. O homem lançou uma mão grande à garganta de Luke. Dedos cerrados como as garras de uma águia a abrir caminho por entre a carne vulnerável.

Com a mão liberta, Luke atingiu-o nos olhos com os dedos indicador e médio, um em cada olho. Não era uma defesa convencional mas servira o seu propósito. O homem soltou Luke e recuou com os olhos a lacrimejar. Pestanejou e abanou a cabeça. Depois sorriu.

A luta ainda agora começara.

E de repente apareceu Newsam, qual fantasma. Pegou na cabeça do homem com ambas as mãos e bateu-a com força contra a parede. Parecia que Ed Newsam queria partir a parede usando a cabeça do homem.

Bang!

O rosto do homem estremeceu.

Bang!

O maxilar deslocou-se.

Bang!

Os olhos reviraram.

Luke levantou uma mão. “Ed! Ok. Acho que arrumaste com ele. Liberta-o devagar, este chão parece de mármore.”

Luke olhou para o outro segurança. Já estava esticado no chão, olhos fechados, boca aberta e cabeça encostada à parede. Ed tinha-os despachado em dois tempos. Luke não tinha feito nada.

Luke retirou um par de algemas de plástico do bolso e ajoelhou-se junto a um dos homens prendendo-o com força nos tornozelos como um vitelo. Alguém acabaria por aparecer e cortar aquilo. E quando o fizessem, o tipo não sentiria os pés durante uma hora.

Ed fez o mesmo ao outro homem.

“Estás um bocado enferrujado, Luke,” Atirou Ed.

“Eu? Não. Eu nem devia lutar, só fui chamado por causa da minha inteligência.” Ainda sentia o ponto da garganta onde o homem tinha apertado. Amanhã ia estar dorido.

Ed abanou a cabeça. “Eu estive na Força Delta como tu. Estive lá dois anos depois da operação Stanley Combat Outpost no Nuristão. As pessoas ainda falam disso. Como vos deixaram lá e como de manhã só três homens ainda lutavam. Eras um deles, não eras?”

Luke pigarreou. “Não tenho conhecimento da existência de…”

“Não me lixes,” Ripostou Ed. “Secreta ou não, eu conheço a história.”

Luke aprendera a viver a vida com pouca margem de manobra. Raramente falava sobre esse incidente. Tinha acontecido há uma eternidade num canto tão remoto do leste do Afeganistão que o simples facto de haver tropas no local deveria ter algum significado. Era passado. A mulher nem tinha conhecimento disso.

Mas o Ed era um Delta por isso… ok.

“Sim,” Disse Luke. “Eu estava lá. Informações incorretas levaram-nos até lá e acabou por ser a pior noite da minha vida.” Fez um gesto na direção dos dois homens no chão.

“Faz isto parecer um episódio de Happy Days. Perdemos nove bons homens. Ficámos sem munições pouco antes de amanhecer.” Luke abanou a cabeça. “A coisa ficou feia e quando amanheceu a maior parte dos nossos já estavam mortos. E os três que sobreviveram… não sei se realmente nos safámos. O Martinez está paralisado da cintura para baixo. A última vez que ouvi falar do Murphy era um sem-abrigo frequentemente internado na ala psiquiátrica da Veterans Affairs.”

“E tu?”

“Tenho pesadelos até hoje.”

Ed apertava os pulsos de um dos seguranças. “Conheci um tipo que esteve lá nas operações de limpeza depois da área estar segura. Disse que contaram 167 corpos naquela colina, sem incluir os nossos. Ocorreram 21 mortes de inimigos em combates corpo a corpo naquele perímetro.”

Luke olhou para Ed. “Porque é que me estás a dizer isto?”

Ed encolheu os ombros. “Estás um pouco enferrujado e não há qualquer problema em admiti-lo. E até podes ser inteligente. E pequeno. Mas também és músculo como eu.”

Luke desatou a rir às gargalhadas. “Ok. Estou enferrujado. Mas quem é pequeno aqui?” Riu, olhando para o enorme corpo de Ed.

Ed também riu. Revistou os bolsos do homem no chão e em pouco tempo encontrou o que procurava. Um cartão para a fechadura digital situada na parede ao lado das portas duplas.

“Entramos?”

“Primeiro tu,” Disse Ed.

CAPÍTULO 12

“Não podem estar aqui!” Gritou o homem. “Fora! Fora da minha casa!”

Encontravam-se numa sala de estar ampla. No canto mais distante estava um baby grand piano branco e as janelas do chão ao teto proporcionavam uma vista panorâmica excecional. A luz da manhã banhava a sala. Próximo estava um sofá branco com linhas modernas e uma mesinha com cadeirões, agrupados em torno de uma televisão de ecrã plano gigante situada na parede. Na parede oposta estava um quadro de grandes proporções com umas manchas loucas e pingos de cor clara. Luke tinha alguns conhecimentos de arte e pareceu-lhe estar perante um Jackson Pollock.

“Pois, acabámos de discutir isso mesmo com os tipos à entrada,” Ironizou Luke. “Não podemos estar aqui e no entanto… aqui estamos nós.”

O homem não era alto. Era compacto e atarracado, e envergava um roupão branco de pelúcia. Segurava nas mãos uma espingarda apontada para eles. Pareceu a Luke uma velha Browning de safari, talvez carregada com cartuchos de uma Winchester .270. Aquela arma abateria um alce a quatrocentos metros de distância.

Luke dirigiu-se para o lado direito da sala e Ed para a esquerda. O homem oscilou a espingarda para trás e para a frente, sem saber a quem apontar.

“Ali Nassar?”

“Quem quer saber?”

“Chamo-me Luke Stone e este é Ed Newsam. Somos agentes federais.”

Luke e Ed acercaram-se do homem.

“Sou um diplomata nas Nações Unidas. Não têm jurisdição aqui.”

“Só queremos fazer-lhe algumas perguntas.”

“Chamei a polícia. Devem estar a chegar dentro de alguns minutos.”

“Nesse caso, porque é que não baixa a arma? Ouça, é uma arma antiga com um ferrolho. Se a disparar uma vez, não terá tempo para a carregar uma segunda.”

“Então mato-o a si e deixo o outro vivo.”

Apontou a arma a Luke que continuou a mover-se colado à parede. Pôs as mãos no ar para mostrar que não era uma ameaça. Já tinha tido tantas armas apontadas que já lhes perdera a conta. Ainda assim, não era uma situação confortável. Ali Nassar não tinha o perfil de um atirador mas se conseguisse disparar, os estragos seriam irreversíveis.

“Se fosse a si, matava aquele homem grande porque se me matar a mim, não sei o que ele será capaz de fazer. Ele gosta demasiado de mim.”

Nassar não hesitou sequer. “Não. Vou matá-lo a si.”

Ed já estava a pouca distância atrás do homem. Percorreu a distância num milésimo de segundo e levantou o cano da arma para cima no exato momento em que Nassar disparou.

BOOM!

Um barulho ensurdecedor invadiu o apartamento. O tiro fez um buraco no estuque branco do teto.

Com um único movimento, Ed arrancou a arma, deu um soco no maxilar de Nassar e encaminhou-o para um dos cadeirões.

“Ok, sente-se e ouça com atenção se faz favor.”

 

Nassar ficou abalado com o soco. Demorou algum tempo a recuperar. Levou uma mão redonda ao vergão vermelho que já se formava no maxilar.

Ed mostrou a espingarda a Luke. “Olha só para isto,” estava ornada com madre pérola e cano polido. Há poucos minutos, deveria ter estado pendurada na parede.

Luke concentrou-se no homem sentado no cadeirão. Começou do início outra vez.

“Ali Nassar?”

O homem não falava. Estava zangado como o Gunner, o filho de Luke, se zangava quando tinha quatro anos.”

Assentiu. “Obviamente.”

Luke e Ed agiram rapidamente sem perder tempo.

“Não me podem fazer isto,” Disse Nassar.

Luke olhou para o relógio. Eram 7 da manhã. Os polícias podiam aparecer a qualquer momento.

Levaram-no para um compartimento mesmo ao lado da sala de estar. Tiraram-lhe o roupão e os chinelos. Usava apenas umas cuecas brancas. A barriga protuberante sobressaía. Estava apertada como um tambor. Sentaram-no numa cadeira de braços com os pulsos e pernas atados.

No compartimento havia uma secretária com um computador de torre e um monitor. O processador estava no interior de uma caixa metálica grossa, presa ao chão de pedra. Não parecia haver uma forma óbvia de abrir a caixa. Não tinha fechadura, porta, nada. Para acederem ao disco rígido, um soldador tinha que cortar a caixa e não havia tempo para isso.

Luke e Ed detiveram-se à frente de Nassar.

“Tem uma conta no Royal Heritage Bank na Ilha de Grande Caimão,” Disse Luke. “No dia 3 de Março fez uma transferência de 250,000 dólares para uma conta em nome de um homem chamado Ken Bryant. Ken Bryant foi estrangulado a noite passada num apartamento do Harlem.”

“Não faço a mínima ideia do que estão a falar.”

“Você é patrão de um homem chamado Ibrahim Abdulraman que morreu esta manhã numa subcave do Center Medical Center. Ele foi morto com um tiro na nuca enquanto roubava material radioativo.”

Uma centelha de reconhecimento cintilou no rosto de Nassar.

“Não conheço este homem.”

Luke respirou fundo. Normalmente, teria ao seu dispor horas para interrogar alguém. Hoje só dispunha de alguns minutos. O quer dizer que teria que fazer alguma batota.

“Porque é que o seu computador está preso ao chão?”

Nassar encolheu os ombros. Começava a recuperar a confiança. Luke quase a podia ver a regressar. O homem acreditava em si próprio. Pensava que os iria empatar.

“Há muito material confidencial aqui. Tenho clientes envolvidos em negócios que implicam questões de propriedade intelectual. Também sou, como já referi, um diplomata nas Nações Unidas. Por vezes recebo informações que são… como dizer? Confidenciais. Ocupo os cargos que ocupo porque sou conhecido pela minha discrição.”

“Até pode ser o caso,” Replicou Luke. “Mas tem que me dar a palavra-passe para eu poder confirmá-lo.”

“Lamento, mas tal não será possível.”

Atrás de Nassar, Ed soltou um riso. Quase parecia um grunhido.

“Pode ficar surpreendido com o que é possível conseguir,” Disse Luke. “A verdade é que nós vamos aceder àquele computador. E vai dar-nos a palavra-passe. Podemos fazer isto a bem ou a mal, a escolha é sua.”

“Não me vão magoar,” Disse Nassar. “Já arranjaram problemas que cheguem.”

Luke olhou para Ed. Ed aproximou-se e ajoelhou-se à direita de Nassar. Segurou a mão direita do homem com as suas duas mãos fortes.

Luke e Ed só se tinham conhecido a noite passada mas já conseguiam trabalhar juntos sem comunicarem verbalmente. Era como se conseguissem ler a mente um do outro. Luke já tinha tido essa sensação anteriormente, sobretudo com tipos que tinham integrado unidades de operações especiais como a Delta. Geralmente, essa empatia demorava mais tempo a desenvolver-se.

“Toca piano?” Perguntou Luke.

Nassar anuiu. “Tenho formação clássica. Quando era jovem, fui pianista. Ainda toco um pouco para me divertir.”

Luke agachou-se para que Nassar o olhasse nos olhos.

“Daqui a nada, o Ed vai começar a partir os seus dedos. Vai fazer com que seja difícil tocar piano. E o mais certo é doer bastante. Não tenho a certeza se é um tipo de dor a quem um homem como o senhor esteja habituado.”

“Não se atreveriam.”

“Da primeira vez, vou contar até três o que lhe dará alguns segundos para decidir o que quer fazer. Ao contrário de si, nós avisamos as pessoas antes de as magoarmos. Não se rouba material radioativo com a intenção de se matar milhões de pessoas inocentes. Isto não é nada em comparação com o que faz aos outros. Mas depois da primeira vez, não haverá mais avisos. Olho para o Ed e ele parte-lhe outro dedo. Compreende?”

“Vou fazer com que o despeçam,” Atirou Nassar.

“Um,”

“Você é um grão de areia sem poder nenhum. Vai arrepender-se de aqui ter vindo.”

“Dois.”

“Nem se atrevam!”

“Três.”

Ed partiu-lhe o dedo mínimo na segunda articulação. Fê-lo rapidamente e sem qualquer esforço. Luke ouviu o ruído mesmo antes de Nassar gritar. O dedo dobrou-se de lado. O ângulo era quase obsceno.

Luke colocou a mão debaixo do queixo de Nassar e levantou-lhe a cabeça. Os dentes do homem estavam cerrados. O rosto estava ruborizado e a respiração era irregular. Mas os olhos mostravam dureza.

“Esse foi só o mínimo,” Informou Luke. “O próximo é o polegar. Os polegares doem bastante mais do que os mínimos. E os polegares também são mais importantes.”

“Vocês são animais. Não vos digo nada.”

Luke fitou Ed. O rosto de Ed era uma máscara rígida. Encolheu os ombros e partiu o polegar. Desta vez, o som de algo a estalar foi bem audível.

Luke levantou-se e deixou o homem gritar. O som era ensurdecedor. Podia ouvi-lo a ecoar no apartamento como uma cena de um filme de terror. Talvez devessem procurar uma toalha para usar como mordaça.

Caminhou pela sala. Não gostava deste tipo de procedimento. Era tortura. Mas os dedos do homem iam sarar. Se uma bomba suja explodisse no metro, iam morrer muitas pessoas. Os que sobrevivessem iam ficar doentes. Ninguém jamais se curaria. Pesando as duas situações, os dedos do homem e pessoas mortas no metro, era fácil tomar uma decisão.

Agora Nassar chorava. Escorria muco transparente de uma das narinas. Respirava com dificuldade.

“Olhe para mim,” Pediu Luke.

O homem fez o que Luke mandou. Os olhos já não dardejavam severidade.

“Vejo que o polegar o chamou à razão. Por isso mesmo, de seguida, vai o polegar esquerdo. Depois disso, começamos com os dentes. Ed?”

Ed dirigiu-se à esquerda do homem.

“Kahlil Gibran,” Arfou Nassar.

“O que disse? Não o ouvi.”

“Kahlil underscore Gibran. É a palavra-passe.”

“Como o autor?” Perguntou Luke.

“Sim.”

E como se trabalha o amor?” Começou Ed, citando Gibran.

Luke sorriu. “É tecer o tecido com fios desfiados de vosso próprio coração, como se o vosso amado fosse usar esse tecido. Temos esta citação na parede da nossa cozinha lá em casa. Adoro estas coisas. Pelos vistos, somos três românticos incuráveis.”

Luke aproximou-se do computador e percorreu o teclado com os dedos. A caixa da palavra-passe surgiu e ele digitou as palavras.

Kahlil Gibran.

E logo surgiu o ambiente de trabalho. A imagem de fundo era uma foto de montanhas cobertas de neve com prados amarelos e verdes em primeiro plano.

“Parece que agora sim. Obrigado, Ali.”

Luke tirou do bolso apertado das calças um disco rígido externo que Swann lhe dera. Ligou-o a uma porta USB. O disco externo tinha imenso espaço. Engoliria sem dificuldade toda a informação contida no computador deste homem. Preocupavam-se mais tarde em desencriptar alguma coisa.

Iniciou a transferência de ficheiros. No monitor, surgiu uma barra horizontal vazia. Do lado esquerdo, a barra começou a preencher-se de verde. Três porcento verde, quatro porcento, cinco. Por baixo da barra, uma enormidade de nomes de ficheiros aparecia e desaparecia à medida que eram copiados para o disco de destino.

Oito porcento. Nove porcento.

Subitamente, ouviu-se agitação na sala principal. As portas de entrada abriram com estrondo. “Polícia!” Alguém gritou. “Larguem as armas! No chão!”

Andaram pelo apartamento derrubando objetos, portas. Pareciam ser muitos. Chegariam ali num instante.

“Polícia! No chão! No chão! No chão!”

Luke olhou para a barra horizontal. Parecia ter parado nos doze porcento.

Nassar fixou Luke. Lágrimas escorriam-lhe dos olhos, os lábios tremiam, o rosto estava vermelho e o corpo quase nu destilava suor. Não tinha uma aparência triunfante.