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ADAM

Tóquio, Japão, 11 de novembro de 2015

Quando ele alcançou a antiga ala do prédio, seu coração estava batendo rápido.

Ele olhou ao redor com cautela, certificando-se de que tivesse deixado para trás todas as garotas com tesão que sempre o seguiam, desejando se tornar sua namorada.

Ser o garoto mais bonito da escola tornou-se uma maldição para ele, especialmente depois do que aconteceu com Arashi.

Só de pensar no que acabara de acontecer, ele podia sentir um pouco mais de energia nas suas pernas.

— Existe um lugar longe o suficiente para fugir do que estou sentindo? — A mente de Adam estava gritando, quando ele alcançou a porta quebrada que conduzia para a sala que outrora foi a biblioteca da escola, antes que o último terremoto tivesse tornando aquele lado do prédio impróprio para uso dois anos antes.

O diretor havia finalmente encontrado um prédio mais barato para construir uma nova biblioteca na ala leste, o que ele preferiu do que reforçar a ala norte e torná-la segura, então esse lugar estava sempre deserto agora.

Ainda abalado pelo beijo de Youra e pelo abraço de Arashi, Adam começou a abrir a porta do seu abrigo secreto… quase secreto, já que teve que dividi-lo com uma caloura no último ano.

Só quando entrou, ele se jogou no chão, segurando a cabeça entre as pernas e esperando que pudesse esquecer o que estava girando em sua mente há muito tempo.

Ele se lembrou da imagem de Youra. Linda Youra. Todo garoto em sua escola faria qualquer coisa para sair com ela, mas toda garota solteira em sua escola venderia a alma ao diabo para sair com ele.

Youra não demorou muito para procurá-lo e pedir para que ele fosse seu namorado e ele concordou só porque era o que todos seus amigos esperavam dele.

Até seu pai apertou suas mãos naquele momento, feliz e orgulhoso dele.

Mas quando ela tentou beijá-lo, ele ficou nervoso e começou a suar frio, enquanto sua cabeça e coração continuavam lembrando-lhe do sorriso de Arashi

— Por que Arashi? Youra é a garota certa para mim! Eu amo Youra! — Ele vinha dizendo a si mesmo há mais de dois meses, mas o sorriso de Arashi, seus abraços ou tapinhas nas costas foram suficientes para tornar Youra em ar impalpável se comparado ao brilho ensolarado de Arashi.

Ele vinha se perguntando até ficar exausto sobre os motivos do seu comportamento, mas sem resultados, até aquele dia pelo menos.

Era apenas algo tolo: alguém havia feito Arashi tropeçar e ele caiu nos braços de Adam, mesmo que apenas por alguns instantes.

Apenas por alguns instantes… mas foi o suficiente para fazê-lo correr para o banheiro para esconder a ereção evidente que pressionava a calça do seu uniforme escolar.

Que vergonhoso!

Ele teve que correr como louco para limpar aquele instinto censurável e impróprio da sua mente. Até a lembrança do corpo nu de Youra não foi capaz de desviar sua atenção disso.

— Por que tudo isso está acontecendo comigo? O que há de errado comigo? — Adam estava abatido e tentou reprimir aqueles sentimentos que pareciam sufocá-lo.

Ele ia desmoronar mais uma vez e dar vazão a lágrimas de frustração e vergonha, quando ouviu mais alguém gemendo dolorosamente na sala.

Ele já tinha ouvido isso várias vezes nos últimos dias, mas parecia muito mais desesperado desta vez.

Sentindo-se curioso e preocupado ao mesmo tempo, ele se levantou e moveu-se devagar até a estante onde os romances de fantasia costumavam ficar.

Sem fazer qualquer som, ele lançou um olhar entre os corredores até que conseguiu ver a garota chorando. Ela estava sentada no chão, como de costume, os braços ao redor dos joelhos que estavam dobrados até o peito e as pernas completamente nuas por causa da saia amarrotada. Ela estava chorando muito.

Ele apagou da mente o lema dos seus colegas de classe, dizendo que ninguém poderia abrir mão da chance de ver a calcinha de uma garota e se aproximou dela.

Assim que a garota percebeu que ele estava li, ela parou de chorar e de repente se levantou com um pulo, enxugando o rosto com a manga do uniforme.

— Pegue — Adam disse, entregando-lhe seu lenço.

A garota pegou o tecido branco com mãos trêmulas e temerosas e enxugou o rosto com cuidado.

— Obrigada… Você é Adam Gramell, não é?

— Sim e você é Kira Yoshida, não é? — conjeturou ele, fingindo não ter certeza da sua resposta, quando sabia perfeitamente quem a garota era. Embora ela fosse dois anos mais jovem do que ele e sempre parecesse tão infeliz, essa garota não conseguiu realmente escapar de nenhum radar masculino desde que entrou na escola um ano antes. Suas feições ocidentais apenas um pouco proeminentes atraíram imediatamente a atenção de todos. Seus pais vinham de dois grupos étnicos diferentes como os dele, mas o pai de Adam era americano e ele havia herdado seus olhos azuis, o que o tornava tão terrivelmente charmoso, além do corpo imponente e musculoso. Em vez disso, Kira tinha os olhos verdes escuros incomuns da mãe, enquanto seus cabelos compridos e lisos eram como os japoneses. Contudo, havia algo terrivelmente charmoso nela e sua expressão misteriosa, discreta e sempre triste a fez objeto da atenção de algum menino, mesmo se, certamente, ela se livrasse de todos eles muito rapidamente.

— Você me conhece?

— Pessoas mestiças como nós nunca passam despercebidas.

Essa declaração pareceu atingi-la, já que ele a viu sorrir pela primeira vez.

— Mas não sou a pessoa mais legal da escola como você: o famoso namorado de Youra Lee-Kuro, campeão de basquete, ídolo da escola e garoto da capa da Lovely .

— Uau! Não tinha percebido que era tão famoso! — interrompeu Adam, sentindo-se desconfortável.

— Não dá para evitar, se você aparece na capa da revista para garotas mais famosa. Você tem futuro como um ídolo respondeu Kira. Ela sempre lia Lovely, desde que sua colega de classe, M i saki, lhe emprestasse.

— Isso foi há três meses.

— Você quer dizer que não vai se tornar um ídolo ?

— Exatamente! Nem agora nem nunca — declarou Adam com um sorriso muito amplo, que tentava esconder sua dor e tristeza por ter sido obrigado a desistir do seu sonho. Ele sempre se encantou com o mundo da moda e a ideia de se tornar um modelo o estimulou desde o começo.

Sua entrevista para a Lovely deveria ter sido a melhor plataforma de lançamento… pelo menos até seu pai acusar a revista de ter enganado seu filho com bobagens e ninharias gays. Ele havia gritado que preferia morrer do que ver o próprio filho andando como uma “aberração”, vestido com roupas “esquisitas” no meio de estilistas “esquisitos”.

— Tem uma vaga na Academia Militar para você, meu filho — seu pai disse com orgulho, já que abominava a possibilidade de que Adam pudesse fazer qualquer outra coisa com sua vida, que talvez não fosse algo muito “heterossexual”.

Ele nunca soube se era culpa dessas palavras ou seu pavor de ser marcado como homossexual pelo pai, mas ele começou a sair com Youra no dia seguinte e assumiram o namoro três dias depois.

Ele não se sentia feliz, mas estava com muito medo de procurar uma solução diferente.

— É uma pena. Não sei por quê, mas sempre pensei que você se tornaria um modelo quando crescesse… Provavelmente porque sempre vejo você desfilando pelos corredores da escola — disse Kira, trazendo-o de volta ao mundo real.

— Obrigado por suas palavras amáveis, mas já decidi seguir os passos do meu pai e me tornar um militar como ele.

De repente, a garota começou a chorar de novo e caiu aos seus pés.

— Ei, você está bem? Eu disse algo errado? — Adam ficou imediatamente assustado e se inclinou na frente dela.

— Odeio militares. — Kira mal conseguia soluçar.

— Pensei que seu pai fosse um militar como o meu.

— Na verdade, ele é… e eu o odeio também. Tive que deixar Princeton por culpa dele.

Adam tentou falar de novo, mas ficou paralisado pelo desespero sombrio da garota.

Ele podia entendê-la tão bem: ela estava confinada em um mundo que não queria.

— Então, este é o motivo pelo qual você costuma vir aqui e chorar? — sussurrou Adam, tentando conter a emoção que a cena estava agitando dentro dele.

Ao contrário de todas as outras garotas da escola, Kira não estava chorando por uma nota ruim, por uma decepção amorosa ou por qualquer outra tolice feminina. Ele ficou muito impressionado com ela.

— Você gostaria de voltar para Princeton? Para seus amigos? — Ele adivinhou mais uma vez.

— Para Lucas. — Kira gemeu e fungou.

— Lucas? Ele é seu namorado?

— Não, ele é meu melhor amigo. Ele está em perigo e não estou mais com ele, para protegê-lo… Nem sei onde ele está no momento e o que está acontecendo com ele — soluçou ela, mostrando a Adam o envelope selado que estava segurando na mão.

Adam virou a carta de cabeça para baixo em suas mãos. Estava endereçada a um Lucas Scott de Kira Yoshida, mas havia sido devolvida a ela com as palavras “endereço desconhecido”, escritas pelo correio com um grande selo vermelho.

— Seu amigo pode ter mudado de casa. Seu Lucas nunca lhe disse nada?

 

Kira parou de chorar com um esforço sobre-humano e tentou se concentrar na explicação que deveria dar a ele. Ela nunca tinha confiado em ninguém no último ano, nem mesmo em sua colega de escola, Misaki, mas, naquele momento, estava com vontade de descarregar o fardo que estava carregando dentro de si em outra pessoa.

Na verdade, ela nunca tinha falado com Adam antes, mas seus olhos a fizeram entender que poderia confiar nele.

— Meu pai foi transferido para os Estados Unidos há cinco anos, então fomos morar em Princeton, perto de Davenport… Conheci Lucas lá. Ele tem a minha idade e estudava na minha mesma escola. Gosto muito dele e sempre tentei protegê-lo daquele açougueiro viciado em álcool, mas…

— Açougueiro viciado em álcool?

— O pai dele — explicou Kira e começou a chorar de novo. — Ele bate nele… Muitas vezes e eu não consegui impedi-lo. Minha mãe tentou também, mas sem sucesso… contudo, ajudávamos muito Lucas com nossa presença e as cenas violentas se tornaram menos frequentes, mas não estou mais com ele agora, eu… eu…

Uma nova explosão de choro.

— Ele está sozinho no momento e não há ninguém pronto para protegê-lo — adivinhou Adam, sentindo pena dele. — E a mãe dele?

— Ela morreu há alguns anos e deixou Lucas sozinho com o pai — respondeu Kira, com uma voz muito desdenhosa e ressentida em relação àquela mulher que deveria ter cuidado do próprio filho em vez de fugir para o além, na opinião dela. — Sou a única que se preocupa com Lucas neste mundo e eu o deixei.

Esse sentimento de culpa e sua dor por esse estado de coisas atingiu Adam como um soco na barriga, deixando-o absolutamente sem fôlego.

— O que ele vai fazer sem mim? Tenho certeza que o pai vai bater nele de novo e eu não estarei lá. Não estou mais lá com ele, você consegue me entender? — continuou Kira, dando vazão à sua profunda frustração. — Minha mãe vive dizendo que Lucas nunca respondeu minhas cartas por culpa do pai e que ele provavelmente nunca as entrega para ele… mas depois desta última, não sei o que devo pensar. Será que algo sério aconteceu com ele?

— Você não consegue ter notícias dele de alguma maneira?

— Graças ao seu emprego anterior, minha mãe conseguiu descobrir que Lucas está bem, mesmo que seu pai tenha perdido muito dinheiro no último ano por causa de algum investimento errado. Mas isso não é o suficiente para mim! Quero voltar para Princeton! Eu nunca deveria ter ido embora! É tudo culpa do meu pai.

— Seu pai foi transferido de volta para a embaixada dos Estados Unidos em Tóquio há um ano, não foi?

— Sim, eu rezei e implorei que ele me deixasse em Princeton. Eu estava pronta para ir para a faculdade, mas ele não permitiu que eu fizesse isso. A pior coisa é que eu realmente tinha certeza de que ficaria lá com Lucas. Eu tinha prometido a ele que nunca o deixaria, em vez disso… não sei se algum dia ele será capaz de me perdoar. Ele vai pensar que sou traiçoeira como a mãe dele.

— Isso não é culpa sua.

— É tudo culpa minha: toda vez que Lucas sente dor, é minha culpa. Meus pais estão sempre brigando por minha culpa… — Kira deixou escapar porque havia percebido as brigas noturnas intermináveis dos seus pais, quando eles acreditavam que ela estava dormindo no quarto. Deixar Princeton também foi difícil para sua mãe, porque ela teve que deixar seu emprego e sua filha estava abatida e irreconhecível, então este também tinha sido um golpe muito difícil para Elizabeth.

— Nunca vi nossa filha chorar tanto, nem quando era bebê! Kenzo, estou tentando fazê-la parar há meses! Eu errei em concordar com você e deixar Princeton. E para quê? Para me tornar a cuidadora da sua mãe? Oh, Kenzo, este não é o tipo de vida que eu desejava. — Elizabeth sempre reclamava.

— Tóquio é minha cidade natal e minha esposa deveria cuidar da minha mãe, que é uma viúva agora e está sozinha. Além disso, já te disse para procurar um emprego em meio período, mas só se conseguir cuidar da nossa filha. Ficar longe de você com tanta frequência foi um erro. Kira precisa nitidamente de um pouco de disciplina e regras morais. — Seu marido continuava dizendo.

— O que você está insinuando? Você acha que não assumo as minhas responsabilidades em relação a ela?

— Eu deveria lembrá-la que nossa filha não fala comigo há meses e está se comportando muito mal com todo mundo? Sem mencionar suas notas ruins na escola! Ela nem passou no exame de admissão na Escola Internacional e está frequentando uma escola japonesa muito comum no momento.

— Kira sempre foi a melhor da sua turma! O que você esperava dela? De repente, você a arrastou para longe da escola, dos seus amigos e acima de tudo, de Lucas! Você sabe o quanto ela se preocupa com ele!

— Você deveria chamá-lo de patife!

— Não é culpa dele se ele tem um pai como aquele.

— Não me importa! A vida de Kira é aqui agora e ela deve aceitá-la! — dizia seu marido todas as vezes antes de sair de casa e bater à porta.

Ao lembrar destas brigas, Kira foi dominada por uma nova enxurrada de lágrimas.

Sem proferir outra palavra, Adam fez com que ela se sentasse em uma cadeira empoeirada e permitiu que ela desse vazão aos seus sentimentos até que ela parasse de chorar.

— Lamento pelo que você está passando — disse Adam, invadindo seus pensamentos. — Não sei o que está acontecendo com seu amigo, mas posso dizer que você deveria confiar mais nele, na minha opinião.

— Eu confio nele!

— Então, pare de considerá-lo como a vítima que ele costumava ser quando vocês eram crianças. Ele está crescendo como você, então logo será capaz de se proteger do pai, você vai ver.

— Mas Lucas é tão pequeno e magro se comparado ao pai.

— Provavelmente ele costumava ser assim, mas tenho certeza que logo se transformará em um cara forte, capaz de cuidar de si mesmo.

Kira olhou para ele com os olhos arregalados. Ela nunca pensou que Lucas poderia ser capaz de se proteger daquele monstro. Na sua mente, Lucas ainda era uma criança pequena e magra de nove anos, coberta de hematomas e arranhões. Contudo, Adam estava certo: Lucas havia crescido e ficado mais forte, mesmo se não fosse o suficiente. No momento.

— Obrigada — murmurou a garota, virando nas mãos o lenço que estava encharcado de lágrimas e muco.

— Sem problemas. Não estava com vontade de ser sobrecarregado com matemática hoje — Adam riu, tentando minimizar o clima.

— Oh, meu Deus, escola! Eu tinha ciências hoje! — Kira lembrou de repente quando olhou para o relógio. Quase uma hora havia se passado desde que fugiu para seu abrigo secreto.

— Acho que é melhor você limpar seu rosto antes de voltar para a escola ou sua professora vai ficar preocupada.

Kira sorriu para ele agradecida.

Eles caminharam juntos até a porta.

— Você não vai contar a ninguém o que eu disse, não é?

— É claro que não! — confortou Adam. Vê-la chorar também foi uma espécie de catarse para ele, além de um alívio, mesmo se não tivesse derramado nenhuma lágrima… quase.

Ele gostou dessa garota. Ele foi capaz de sentir sua sensibilidade e doçura durante aquele curto período de tempo.

Ele não tinha visto ninguém chorar por um amigo até então.

Ela queria proteger Lucas e defendê-lo das injustiças da vida.

Ele gostaria de poder ter alguém como ela ao seu lado também!

— Posso fazer uma pergunta? — perguntou Kira após um tempo.

— Claro.

— Por que você normalmente se esconde na biblioteca também e às vezes chora? — perguntou ela com cautela.

— O quê? Eu… ? — gaguejou Adam inquieto.

— Sim, eu te vi. Mas se você não quiser me contar, eu entenderei.

Adam suspirou abatido e todos os pensamentos que o vinham assombrando desde que ele fugiu, afloraram de novo com violência em sua mente.

Como ele deveria responder?

— Acho que há algo diferente dentro de mim — disse ele em um sussurro, percebendo o significado das suas próprias palavras pela primeira vez.

***

Princeton, Kentucky, 11 de novembro de 2015

— Sinto muito, Sr. Lucas — disse Rosalinda, que se tornara a ex-governanta da família Scott, suspirando com tristeza.

— Eu também sinto muito — murmurou Lucas deprimido, sem tirar os olhos do seu dever de casa. Ele não suportava as lágrimas dessa mulher. Lágrimas falsas. De crocodilo. De mulher.

— Você chora no começo, depois trai e vai embora — disse o menino, desejando que pudesse gritar com ela, mas se conteve e agarrou a caneta com violência até quase quebrá-la.

— Você não precisa mais de mim aqui. Sua casa é pequena e seu pai não me quer. — Rosalinda tentou se justificar.

— Está tudo bem.

— Sinto muito.

Pelo quê? Por aproveitar a oportunidade e fugir de um patrão violento e bêbado que com frequência também bate em você? Pensou ele, desejando poder responder dessa forma.

— Aproveite a indenização do meu pai.

— Sr. Lucas, eu não queria ir embora. Fiquei aqui todos esses anos só por você… As coisas pioraram depois da morte da sua mãe, mas eu fiquei apesar de tudo, mesmo que nunca tenha sido corajosa o suficiente para me revoltar contra o Sr. Scott.

— Adeus, Rosy — interrompeu Lucas, já que não suportava mais as palavras dessa mulher. Ela deveria ir e aliviar sua consciência com outra pessoa! Ele tinha que estudar, pois estava cansado de ser provocado pela maneira como lia na frente de outras pessoas ou pelas suas notas ruins, mesmo se ele se esforçasse ao máximo para fazer melhor.

Desde que Kira foi embora, sua mente inteligente e sagaz como ela costumava chamá-la, parecia ter se aposentado.

Kira…

Só de pensar nela, ele podia sentir seu estômago revirando até que tivesse que se curvar pelos espasmos.

Ele nem notou que a governanta ainda estava parada na porta do seu quarto.

— Sr. Lucas.

— O que mais você quer de mim? Eu te disse para ir embora! — explodiu o garoto, de repente furioso.

— Cometi muitos erros com você, quando costumava apoiar seu pai… Eu estava com medo, mas… Não, não tenho nenhuma desculpa, mas vou contar algo que sempre mantive em segredo.

— Não me importa — interrompeu Lucas, ficando cada vez mais furioso.

— É sobre Kira, a garota que voltou para o Japão no ano passado — insinuou Rosalinda, sabendo que era um assunto delicado.

Kira. Mais uma vez.

Um novo espasmo atingiu seu estômago com violência.

— Não me importa — disse Lucas mais uma vez, torcendo as mãos para parar de tremer de raiva e desespero como tinha feito aquele ano todo. O pior ano da sua vida.

— Sei que você está mentindo. Aquela menina era tudo para você, Sr. Lucas. Eu vi o quanto você sofreu nos últimos meses. Você tem que me entender: eu gostaria de ter contado antes, que Kira não o esqueceu, como o Sr. Scott fez você acreditar. Eu me arrependo do que fiz, mas não quero ir embora sem contar verdade. Kira escreveu várias cartas para você nos últimos meses. Oitenta e seis, exatamente.

Ela finalmente conseguiu captar a atenção de Lucas: ele a encarava perplexo, com os olhos arregalados.

— Oitenta e seis cartas? Então, onde elas estão? — Ele conseguiu perguntar, enquanto seu cérebro estava tentando se concentrar em suas palavras.

— Seu pai as pegou e queimou. Todas elas — revelou ela, enquanto evitava dizer a ele que ela sempre as lia. — Sinto muito.

Lucas ficou olhando para o espaço, com a mente confusa, por muito tempo antes que conseguisse mover um único músculo.

Ele nem reagiu quando Rosalinda continuou dizendo que sentia muito, antes de sair daquela casa, para nunca mais voltar.

Quando Lucas voltou ao mundo real, ele podia sentir apenas uma raiva cega contra o homem que o trouxe ao mundo e depois tirou dele até o pobre consolo que ele poderia obter ao ler as cartas da sua melhor amiga.

Ele vinha sofrendo há muito tempo e odiava Kira por tê-lo deixado, após ter jurado várias vezes que nunca faria isso.

 

Ela havia dito que estava pronta para desistir de tudo por ele e que nunca o deixaria, mas em vez disso…

Nem mesmo a camiseta que ela lhe dera naquele maldito verão restou para ele, pois ele a rasgou em um ataque de loucura, após ter recebido alta do hospital por causa de um ombro deslocado.

Ele havia caído da escada por acidente. Ele lhes disse após seu pai ameaçá-lo.

Ele caminhou para a sala de estar em estado de transe, pois sabia que encontraria seu pai ali, bêbado como um gambá.

A casa deles era pequena, ao contrário da villa em que moravam no passado e que esse monstro cruel havia perdido tolamente em uma partida de pôquer um mês antes.

Ele chegou rapidamente ao piano-bar, onde encontrou uma garrafa vazia de Bourbon na bancada.

Seu pai estava se abaixando e procurando outra coisa para beber, mas teve um vislumbre da chegada do filho e se levantou.

— Onde está Rosalinda? Quero que ela vá comprar mais Bourbon — o homem murmurou enquanto cambaleava até a poltrona, mas seu filho bloqueou seu caminho.

— Você a demitiu, não se lembra? Ela foi embora há alguns instantes e me contou sobre as cartas de Kira — disse Lucas, tentando conter a raiva que estava começando a prostrá-lo.

— Vadia idiota! Por que ela tinha que contar?! Gostaria de tê-la demitido antes.

— Como você ousou queimar as cartas de Kira — explodiu Lucas, sem conseguir se conter mais.

Seu pai olhou para ele por um instante, intrigado com o repentino ataque verbal do filho, então ele se recuperou.

— Sou seu pai e posso fazer o que quiser! Você me pertence.

— Eu não pertenço a você! — gritou Lucas em resposta.

— Como você ousa falar assim com seu pai? — O homem ficou zangado, dirigindo o punho ao peito do menino, mas Lucas conseguiu evitá-lo com um salto de felino. Contudo, ele estava muito zangado para ficar satisfeito por se proteger. Ele precisava extravasar um pouco.

Ele sentiu o desejo de dar vazão à sua raiva ao bater em alguém pela primeira vez em sua vida, então, antes mesmo que pudesse perceber esse novo desejo, ele podia sentir todo seu corpo se esticando na direção do homem que havia transformando sua infância em um inferno e acertando sua mandíbula com violência, aproveitando-se da sua instabilidade de bêbado.

Ele foi trazido de volta à realidade por uma dor aguda em sua mão.

Darren Scott ficou surpreso e chocado com o ataque, que foi mais violento do que ele gostaria de admitir: ele caiu de joelhos e sentiu uma dor imensa no rosto.

Ele estava tentando se levantar, quando foi atingido de novo, por um chute poderoso que o deixou sem fôlego.

— Bastardo idiota! — gritou o homem para Lucas, ofegando e tentando se proteger.

— Você é o bastardo aqui! — O menino respondeu, então o agrediu mais uma vez.

— Vou buscar meu cinto, então veremos se você ousa falar comigo assim de novo — ameaçou ele, com uma voz trêmula de raiva.

— Apenas bata em mim! Bata em mim o quanto quiser, pai! Estas são as únicas coisas que você consegue fazer: ficar bêbado e bater em mim. Bem, você pode fazer isso, mas não vou mais ficar parado e esperar pelo seu golpe de cinto! — gritou seu filho para ele exasperado, enquanto continuava a socá-lo.

— Sua… mercadoria estragada… — balbuciou o homem, abalado com a agressão do filho.

— Você é a mercadoria estragada! — respondeu seu filho de repente. Ele estava cansado dessa agressão que não conseguia mais impedir e que parecia ficar cada vez mais forte a cada novo golpe.

Seu pai começou a rir com desdém.

— Lucas, lembre-se disso: uma fruta nunca caí longe da sua árvore.

— O que você quer dizer?

— Quero dizer que você é tão danificado e estragado quanto eu. Você é meu filho e eu sou seu pai! Meu sangue corre nas suas veias!

— Não vou ser como você!